Responsabilidade

Tenhamos o mínimo de decência e patriotismo. Dizer que o mal do Brasil é o brasileiro, que na Europa os programas sociais funcionam porque lá moram europeus não vai mudar nada por aqui. Eles estão sendo educados há séculos, e nós, há poucas décadas. Urge nossa necessidade de educação. Patriotismo é olhar para os famintos e desalojados e dizer que sim, isso é problema meu. “Mas e quanto a essa vagabundo, sem educação alguma, esse bandido? A culpa é dele, ele que se foda, pois é um câncer da sociedade. Não é problema meu.” Pois eu estou aqui para dizer-lhe, meu caro compatriota, que está enganado. É problema seu sim. E meu. Tenhamos dignidade. O Brasil arrecada impostos sim, toda nação necessita disso e a falha está em como se aplica (ou se desvia) esse montante.
Há incontáveis anos nos ensinaram a odiar os pobres, e o pior: colocaram na cabeça da “classe média” que ela ficará rica pisando nos pobres. Que querem pegar nosso dinheiro e dividir. Estou aqui, meu caro concidadão, para lhe assegurar que o discurso comunista está errado no que prega que se mate a galinha para dividir-lhe a carne. É preciso manter a galinha viva, trabalhando para repartirmos os ovos. Esse é o discurso. Quer que tudo funcione? Substitua seu ódio por ações eficazes de fiscalizar e exigir justiça quando pegarem sua parcela de responsabilidade (entenda impostos) pelos famintos, desalojados e carcinomas sociais e não derem o destino correto.
Prendam todos os bandidos.
O verdadeiro câncer da sociedade não nos assalta à mão armada.

Poema Classificado nº29

Essa semana saiu no jornal o #PoemaClassificado nº29. Série despretensiosa, mas que tem saído com certa regularidade, o que tem me dado bastante gosto: Além de tais poemas serem impressos no jornal local, já chegaram a várias cidades do Brasil estampados em postes, através de amigos que resolveram #EspalharPoesia por aí!

Por isso criei dois álbuns na página do Facebook (cliquem nos poemas abaixo para serem redirecionados).

Espero que gostem!

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Ponches et Circenses

Conforme prometido pela anfitriã
A recepção de Madame Zoraida
Já se prolongava até a manhã
Após o ludibrioso espetáculo do circo Malakov
Regalavam-se os convivas a ponche gelado
E Harvey Wallbanger de vodka Askov

Acomodado em uma chaise long
Desenhada por Le Corbusier
O arguto doutor Cheng Fong
Ajustando o pince-nez
Defendia o palhaço Kablong
Que tirara de cena de modo abrupto
O espetaculoso domador de pôneis
A contragosto do respeitável público

Madame Zoraida encolerizada,
Bradava ofensas ao tal saltimbanco:
– Pois eu digo que tudo não passou de um golpe!
– Golpe não foi! Visto que ambos são da mesma trupe!
– Golpe sujo e baixo! – Insistia a madame
– Não vejo o porquê! – fez o doutor
– Pois veja bem, que palhaço infame…
– Alto lá Zozô! Infame é dar show a domar alguns pôneis!

Enquanto os comensais acalorados
Tomavam partidos na capciosa contenda
Já altos de ponche e outros derivados
De lá da cidade, no fundo da tenda
O velho palhaço se demaquilava
E o domador abria um Velho Barreiro
Que há pouco fora buscar na venda
Ao sair mais cedo do picadeiro.

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O Mestre e o Gafanhoto (a parábola das merdas)

Certa feita, um curioso viajante
Tendo notícia da fama do erudito Lokprakash¹
-Cujo renome já se espraiava
Desde o sopé do Himalaia
Aos confins de Bangladesh-
Foi ter com o ancião.

Pouco antes do encontro
Quis a sorte do viajor
Foder Feder com a ocasião
E o lustroso sapato Dior
Pisou luzidia merda no chão
Impregnando-se em raro fedor

Ora, o elegante visitante
Quedou-se triste e vexado
Pois caprichara na toalete
Com perfume almiscarado
Mas vendo chegar o indiano
Gaguejou embaraçado:

Oh, sa-sábio mestre Vatsala
Perdoe-me os modos
Digo, Sua Santidade,
Lokprakash Vatsala
Não quero causar incômodo
Mas quis a eventualidade…

Disse isso tudo o forasteiro
Mostrando o próprio sapato
E o descalço guru, bem ligeiro
Meteu-lhe na cara um sopapo:
– Ingrato! Não vês que é auspicioso
Pisar assim, em um grande merdeiro?

Pois saiba de agora em diante
Que só não pisa na merda aquele
Que anda sempre cabisbaixo
– Mas mestre. – Retorquiu o visitante
Não sei ao certo se nisso me encaixo
Veja bem, que a bosta era grande!

– Quanto maior a bosta, maior a sorte.
Pois o homem que não a enxerga
Certamente está de cabeça erguida:
Possui metas, é sábio e forte
E não se envergonha da vida vivida.
Por isso digo: mais merda, mais sorte.

– Então sendo assim… E se fosse um cocô de vaca?
– Vaca sagrada, sorte multiplicada.
– Se fosse então, cocô de elefante?
– Cocô muito grande, sorte gigante.
– Entendi. Quanto mais cabeça erguida…
– Sim. Desde que seja o seu natural.

– Mas mestre, por favor me diga:
E se por acaso, um pombo acertar
Seus dejetos em minha cabeça?
– É sorte! – respondeu com veemência.
Apesar de que talvez seja
Incômodo de se limpar.

– Ok. Mas há erro na teoria
Pois se há auspício na altivez
E quanto mais alta a cabeça, melhor,
Talvez um pombo acertaria
Não a cabeça, mas os olhos do freguês!
E não vejo sorte em ter os olhos cagados.

Lokprakash cerrou os olhos e, após um longo suspiro, concluiu:
– Aprenda de uma vez, pequeno gafanhoto,
Que o sábio mantém a cabeça erguida
Mas nunca de forma exagerada
Pois sabe que assim age o tolo
Que de tanto a erguer não enxerga a estrada.

                               ***

¹Lokprakash Vatsala é um personagem que aparece em 4 poemas do livro “O Busto de Adão e Outras Poesias” (págs 31/33 e 49/54). Dado à incomensurável sabedoria e carisma do ancião indiano, achei justo dar vazão a novos poemas onde ele possa doutrinar.

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Lokprakash Vatsala em “O Mestre e o Peregrino” (O Busto de Adão e Outras Poesias, pág. 40) Ilustração de Arthur F. Pádua.

 

 

Malabarismos

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O excesso explicado através do mínimo.

Por isso escolhi um Haicai para ilustrar o momento:

Há duas semanas mergulhei de cabeça no projeto literário mais gostoso que já fiz até hoje, motivo de minha ausência por aqui. Enquanto me divirto com o malabarismo de conciliar trabalho, família, música, faculdade e escrita (meu heterônimo tem exigido textos diário e pontuais), tive o insight desse belo Haicai que datilografei assim que o tempo me permitiu.

PS: dia quente e corrido aqui no sudoeste de Minas Gerais.

Abraços múltiplos,

Bruno Félix

A criação em quatro noites

Era a música complexa
Demais para a noite
Para as criaturas da madrugada
E Deus disse: “Haja Blues”
Deus ouviu que o Blues era bom,
Viu que dançavam, bebiam, fumavam,
Amavam no embalo do som
Assim foi a primeira noite

Então Deus separou o simples
Do sofisticado. Deu a estes o sopro
E um belo teclado. Deu mais swing nos pés
E disse maravilhado: Faça-se o Jazz.
Passaram-se tarde e manhã
E nasceram mais melodias
Deus viu que aquilo era bom
Que a Criação era sã

Ora, Deus não quis que perdessem
Aquela bela harmonia no ar
Então no terceiro dia
Disse: “Ajuntem tudo num só lugar
As harmonias e melodias dos homens
Encham discos com as canções
Que sejam férteis e multipliquem-se!
Encham a Terra com a Boa Música.”

E Deus viu tudo o que havia feito
E tudo havia ficado muito bom
E na quarta noite a criação
Por si só fez um novo toque
E Deus, ouvindo tal emoção
Abençoou o inédito Rock
E dizendo assim o santificou:
Let there be rock! Let it roll, baby, roll

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Poker Face: O Rio, A Vida e o Ventilador.

É chegada a fatídica hora
De jogar tudo no ventilador
De colocar as cartas na mesa
A hora é sempre, é quando, é agora.
E o que a vida me deu?
Heróis.
Na mão, um par de ases
Diamante e Coração
A ansiedade agora corrói.
Mas a vida, ah, a vida
Logo no flop me fez iludir
Mostrou-me Valete, Rei e Rainha
Heróis
Espada, Coração e Diamante
Fizaram-me feliz o semblante
Não soube jogar.
Eu teria ao final um flush?
Hush, hush…
hush hush somebody’s calling my name
O amanhã trouxe
Sombrio turn
Now I’m not the same…
Mas a vida, me deu esperanças
Me deu coragem
E falsas lembranças
O Rei mente,
A Dama finge
Mas eu tenho meu par de ases
E a vida quis dar-me asas.
Decifra, ou sucumbe à esfinge!
Joga!
Joga alto!
Aposta teu sonho
Tuas escolhas
Não te encolhas
Sonha, joga, vive!
E joguei.
Com todas as forças, joguei.
E agora, o Rio se abre
Vim até aqui cantando:
Take me to the river
And wash me down
Mas no rio, amigos,
Não há Ases:
Há Valete de Paus.
Não fiz o meu jogo
E o mundo sorri.
É chegado o fatídico dia.
Eu caminhava sob um sol frio
Na mente, toda a poesia
Que agora transcrevo.
Não há mais fichas.
Já não acredito no Rei
Que Dama e Valete finjam
De minha parte, não fingirei
Não mais pedirei que alguém jogue
É hora de me levantar
Sacudir o smoking
Com a dignidade de um bom perdedor.
Hei de sair por onde entrei.
Passarei de cabeça erguida sem fitar o guichê
Na saída pretendo apenas tirar as mãos suadas dos bolsos
E descansar um minuto
Embaixo do ventilador.

7

Blues e Poesia na 16ª Feira Nacional do Livro de Ribeirão Preto

Sábado, dia 18, participarei novamente da Feira Nacional do Livro de Ribeirão Preto. Nessa edição, representarei minha cidade ao lado dos Acadêmicos da APC, na qualidade de Membro Honorário. Em nossa mesa, pretendo contar um pouco da história do blues e como esse gênero musical influenciou não só minha música, mas também minha escrita. Alguns poemas d’O Busto de Adão serão recitados, sublinhados e/ou intercalados por clássicos do blues de Robert Johnson (sim, vou levar um violão para a Feira do Livro!). Ah, atualizei a AGENDA, mas fiquem de olho, semana que vem tem mais novidades musicais!

Clique no link abaixo para acessar a programação completa do evento!

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Abraços, e até lá!

Flipoços 2016 – Momento Poético

Acabo de chegar em casa após participar da 11ª Feira Nacional do Livro de Poços de Caldas & Flipoços 2016. Lá, tive a honra de apresentar o Momento Poético ao lado do poeta Maurício Vieira, que atualmente reside em Paris. Em nossa mesa, intitulada Orfeu do Blues – da poesia grega aos menestréis do Mississippi,  traçamos uma linha de conexão entre a lira de Orfeu e a guitarra do delta blues, entre Hades e a Encruzilhada, para enfim chegarmos às nossas principais influências na escrita e finalmente a alguns poemas nossos.

Musicalmente, fomos acompanhados por Lorinho, grande músico Poços-Caldense que tive o prazer de conhecer na ocasião.

Voltei impressionado com a organização do evento, que além de receber a todos com extrema atenção e boa vontade, mantinha tudo fluindo na mais perfeita harmonia: horários da vasta programação cultural seguidos à risca, espaço SESC Flipoçinhos com teatro, contação de estórias para crianças além de outras atividades, palestras master de peso (tivemos a oportunidade de assistir à Monja Coen e aprender muito! – foto) e muitos convidados, editores, escritores, enfim, o prato cheio para bookaholics e afins.

Algumas fotos da apresentação do Orfeu do Blues, você pode conferir clicando na foto abaixo (aproveite e curta a página!):

Obrigado pela visita, e até a próxima!
Abraços poéticos,
Bruno.